* Publicado originalmente no Blog Acesso no dia 22 de janeiro de 2013.
Dividir gastos e somar possibilidades de criação estão entre as razões apontadas por profissionais criativos e empreendedores culturais que optaram por produzir em espaços de trabalho compartilhados. “Quando a gente coloca pessoas com experiências, ideias e formações diferentes no mesmo espaço, pensando e fazendo as coisas juntas, temos uma riqueza de abordagens que resulta em soluções criativas mais abrangentes”, explicou Fernando Carvalho, da Levante Design, escritório que, junto à Prime Design, integra a CASA DEZiNOVE.
Sediada no Rio de Janeiro, a CASA, segundo Carvalho, surgiu de forma casual, entre amigos que estudaram juntos, mas que desenvolviam trabalhos diferentes e cujas empresas de design surgiram em momentos diferentes. A partir das conversas entre os amigos, veio a ideia de ocupar a casa 19 de uma vila no Largo do Machado, Zona Sul do Rio de Janeiro. “Não sei se é uma tendência, mas acho que os resultados são positivos”, disse.
“Num primeiro momento, nós apenas dividíamos o mesmo teto e trocávamos ideias ocasionais sobre projetos que as empresas desenvolviam separadamente. Com o tempo, percebemos que o espaço em si dava a possibilidade de realizarmos projetos juntos e ideias que já vínhamos cultivando desde a faculdade, como, por exemplo, a vontade de trabalhar com arte. Daí a CASA ter, hoje, como uma das suas principais atividades a de galeria de arte contemporânea com foco principal em novos talentos”, contou Carvalho.
A casa, segundo o designer, não é apenas um espaço comum onde as empresas trabalham separadamente. Nele são realizados projetos que ultrapassam a atuação de cada empresa e existem no lugar de encontro de todos os sócios. “Todos somos designers de formação, mas temos expertises diferentes que se complementam: temos artistas plásticos, fotógrafos, designers de produto, designers gráficos, professores e empreendedores na equipe. Esse conjunto de forças propicia um espaço de trabalho extremamente vivo, produtivo e estimulante”, explicou Carvalho.
Outro ponto em comum dos ocupantes da casa são as raízes no design social e no design participativo. “Queremos acessibilizar a cultura e o conhecimento em artes e design, ajudando a promover um crescimento coletivo mais democrático”, disse. Além dos escritórios e da galeria, a casa também abriga espaço para oficinas, cursos e palestras que, quando não são gratuitas, têm vagas reservadas para pessoas que não tenham condições de pagar.
Condomínio de artistas, produtores e ambientalistas
Em Salvador, entre produtores, artistas e ambientalistas participantes da Rede de Agentes Culturais da Bahia, surgiu um pequeno grupo que, desde 2002, organizou, em um prédio do centro histórico soteropolitano, o Condomínio do Empreendedor Cultural – CEC, formado por entidades, organizações não governamentais, pequenos empresários e profissionais autônomos das áreas de cultura, educação, comunicação, meio ambiente e turismo.
Segundo Cristina Alves, produtora cultural e integrante do CEC, o que motivou as pessoas a reunirem-se para produzir neste modelo foi a percepção das possibilidades de crescimento do mercado e, principalmente, a necessidade de aprimoramento profissional. “O modelo CEC não é somente a disponibilização de estrutura para trabalhos de profissionais liberais, mas um conjunto de pessoas vinculadas a uma ideia de ação colaborativa em prol da geração de trabalho e renda, prestação de serviços a preços justos, optando pela prática da economia solidária”, contou Alves.
No CEC, as possibilidades de desenvolvimento de projetos, as oportunidades de prestação de serviços e a formação de equipe para atendê-los são avaliadas e organizadas coletivamente, de acordo com as competências de cada pessoa ou grupo. “A mola que nos move é a ética, a fraternidade, a colaboração e o companheirismo, sem esquecer a disposição de alma para levar em consideração as características, as dificuldades ou as limitações de cada um”, explicou a produtora.
Para Alves, os principais fatores que motivam a opção por trabalhar em um espaço comum são a diminuição dos custos em estrutura e as oportunidades de ações colaborativas. “Assim como os demais colegas, concluímos que sim, há uma tendência ao modelo. Tanto que muitos outros grupos começaram a praticá-lo”, disse Alves ao observar como diferentes campanhas, movimentos e programas convidam o CEC para contribuir com ideias de formas de participação.
A produtora citou uma série de atividades desenvolvidas pelo CEC na linha das ações colaborativas, como a formação de membros de grupos ou associações nas áreas de planejamento estratégico, gestão participativa, capacitação para atuação em redes de educação ambiental nas comunidades, elaboração de projetos, oficinas de cultura digital, oficinas de gestão financeira e prestação de contas, entre outras. Além disso, o CEC também participa de grupos gestores de espaços culturais como, por exemplo, a Rede Camol, rede colaborativa para desenvolvimento local que inclui educação ambiental, saúde, cultura e envolve o poder público, empresas, comunidades, escolas e centros comunitários no subúrbio ferroviário de Salvador.
No entanto, o espaço ocupado pelo CEC, em um prédio construído em 1917 na Rua Tira Chapéu, no centro histórico de Salvador, encontra-se, atualmente, em uma situação delicada. Interditado pelo proprietário, o grupo não está mais autorizado a utilizar o espaço, embora o prédio faça parte das etapas finais do projeto de preservação do centro histórico. “As mudanças constantes nas gestões estadual, municipal e federal no campo da cultura tem retardado a questão da preservação do centro antigo de Salvador, que prossegue muito lentamente. Da mesma forma, as antigas propostas de dar destino aos espaços subutilizados ou abandonados para utilização dos grupos emergentes no exercício da economia da cultura – que foi uma das ideias do CEC encaminhadas para os gestores públicos – se encontram até hoje à espera de uma ação concreta ou de, no mínimo, serem incluídas nos programas governamentais”, contou Alves.
Bernardo Vianna / Blog Acesso