* Publicado originalmente no Blog Acesso – o blog da democratização cultural em 7 de março de 2013.
Alguns dos movimentos culturais mais instigantes atualmente em curso no Brasil, como o próprio movimento dos Pontos de Cultura, têm em comum a proposta de produzir cultura de um modo diferente do convencional. Pautada por princípios como cooperação, solidariedade e autogestão, a economia solidária é uma das características dessas iniciativas e, mais do que um conceito ou uma proposta, é um movimento mundial que tem apresentado novas formas de produção cultural.
No Brasil, a economia solidária integra as políticas públicas do Ministério do Trabalho e do Emprego por meio da Secretaria Nacional de Economia Solidária – Senaes, embora, como tema transversal, conte com ações desenvolvidas por outros ministérios e secretarias. No entanto, o trabalho associado e as formas organizacionais da economia solidária ainda têm dificuldade em acessar financiamentos públicos. Por esse motivo, o Fórum Brasileiro de Economia Solidária – FBES realiza a Campanha pela Lei da Economia Solidária, com o objetivo de criar a primeira lei brasileira que reconheça o direito ao trabalho associado e colaborativo e apoie as iniciativas da economia solidária.
Sobre o tema da produção cultural solidária, entrevistamos Daniela Rueda, integrante da secretaria do FBES e parceira da Viração Educomunicação no Conselho Virajovem DF.
Acesso – Em termos gerais, como você definiria o conceito de economia solidária?
Daniela Rueda – A economia solidária é um movimento que propõe outra forma de organização social e econômica a partir da produção, do consumo, do crédito e da prestação de serviço, com base nos princípios da autogestão, da cooperação, da divisão justa, do uso sustentável do meio ambiente e do respeito ao ser humano.
Acesso – Que possibilidades esse conceito abre para a produção cultural?
D. R. – Esta proposta abre-se a todas as iniciativas culturais que queiram trabalhar sobre os princípios e sobre a proposta política e de sociedade da economia solidária. Isto é, um grupo de teatro que trabalhe de forma coletiva e autogestionária, que realize rodízio de tarefas e repense sua forma de produzir um cenário, ou mesmo o desafio que os Pontos de Cultura estão colocando neste sentido, são formas de economia solidária. A grande questão está no produto cultural, já que sua quantificação é diferente de um produto como o do artesanato. Mas são desafios que necessitamos superar. Existem diversas iniciativas que conseguiram driblar essa questão. Então, é uma questão de valorização do produto cultural e de integração entre as estratégias, que passa pela crítica e pela construção deste mundo que queremos.
Acesso – Que iniciativas seriam essas capazes de produzir cultura a partir do conceito de economia solidária?
D. R. – Temos alguns exemplos como o Circuito Fora do Eixo, que é uma rede de produtores culturais. Eles possuem uma moeda própria para circulação. Também temos grupos de música, como o Bate Palmas, do Ceará, que faz parte dos Fundos Solidários e está ligado ao Banco Palmas. Dentro da estrutura do Fórum Brasileiro de Economia Solidária, temos o GT Nacional de Educação e Cultura, que está fazendo esforços no sentido de mapear os grupos culturais e de estabelecer relações de troca com os Pontos de Cultura.
Acesso – Como você avalia as políticas públicas de fomento à economia solidária?
D. R. – Em relação às políticas públicas voltadas à economia solidária, no estado de São Paulo temos algumas leis municipais, como em Osasco e Carapicuíba. Temos também uma lei no âmbito estadual, a Lei 14.651 de 2011, que cria o Programa Estadual de Fomento à Economia Popular Solidária – PEFES. O entrave está na regulamentação da lei e na criação do fundo. No geral, temos muitas leis em âmbito municipal e estadual, mas não temos uma lei federal que reconheça o trabalho associado. Por isso, estamos em campanha pela criação da Lei de Economia Solidária.
Acesso – Que outras ações de fomento você destacaria?
D. R. – Temos, hoje, muitas ações ligadas ao desenvolvimento de bancos comunitários, pois acreditamos no desenvolvimento endógeno, a partir das comunidades. Isso é feito com o uso de moedas sociais, a fim de concentrar as riquezas no local. Também é importante destacar o trabalho relacionado às cooperativas de reciclagem, tanto no seu fomento como na compra de equipamentos e na construção do trabalho autogestionário.
Bernardo Vianna / Blog Acesso