* Publicado originalmente em VIA blog – Direitos da Criança e do Adolescentes em 2 de julho de 2013.
Um dos objetivos do milênio das Nações Unidas é reduzir pela metade a proporção de pessoas sem acesso sustentável à água potável. Em todo o mundo, mais de um bilhão ainda não tem acesso à água segura para o consumo, o que afeta, em especial, as crianças, parcela da população mais vulnerável. De acordo com comunicado divulgado pelo Unicef, a cada 15 segundos uma criança morre por razões relacionadas à falta de água potável. “Com vontade política, investimento e enfoque na igualdade, todas as crianças poderiam ter acesso a fontes de água potável e saneamento básico”, afirmou o comunicado do Unicef.
De acordo com o Relatório sobre o Desenvolvimento dos Recursos Hídricos, divulgado pela ONU-Água, a cada três anos, problemas associados à falta de saneamento, contaminação e fornecimento impróprio da água e ineficácia ou mesmo ausência de políticas de higiene são responsáveis por 3,5 milhões de mortes por ano. O documento afirma, ainda, que perto de 10% das doenças registradas em todo o mundo poderiam ser evitadas, caso houvesse maior investimento dos governos em acesso à água, em medidas de higiene e em saneamento básico. Em especial nos países em desenvolvimento, afirma o texto da pesquisa, seria possível praticamente eliminar as doenças diarreicas, que estão entre as principais causas de morbidade e mortalidade infantil, com tal atitude por parte dos governos.
Uso sustentável dos recursos hídricos
Segundo Helio Mattar, presidente do Instituto Akatu, que, entre outros temas, trabalha a questão do consumo consciente e sustentável dos recursos hídricos, o volume de água adequada para o consumo, um recurso já escasso, vem diminuindo, entre outros fatores, pelo mau uso. “As principais causas são a pequena quantidade de água potável disponível, o crescimento exponencial da população e o consumo não sustentável desse recurso – que inclui o desperdício, seja individual, seja nas redes de distribuição –, o mau uso e a poluição da água”, explicou.
“Na Terra, 97,5% da água correspondem à água salgada e apenas 2,5% referem-se à água doce, dos quais só 0,26% está disponível em lagos, reservatórios e bacias hidrográficas. Isso significa dizer que apenas 0,0065% da água na Terra é água doce disponível”, afirmou Mattar ao ilustrar que, em uma comparação simples, se toda a água da Terra coubesse em um balde de 10 litros, a água doce disponível seria o equivalente a apenas 13 gotas.
O consumo dessas 13 gotas, ainda segundo o presidente do Akatu, vem crescendo mais que o número de habitantes do planeta. Ao longo do século 20, a população mundial aumentou 3,6 vezes – de 1,65 bilhão para 6 bilhões de pessoas –, enquanto o consumo de água cresceu dez vezes – de 500 km³ por ano para aproximadamente 5.000 km³ por ano. “Ou seja, o consumo consciente desse recurso é fator decisivo para que se garanta que a água potável siga existindo no planeta”, afirmou.
Distribuição dos serviços de água e saneamento
A relação entre os problemas de saúde, que afetam principalmente a parcela da população compreendida pelas crianças, a falta de acesso à água segura para consumo e a ausência de saneamento é confirmada por estudo divulgado pelo Instituto Trata Brasil. A instituição organizou um ranking entre as 100 maiores cidades do País levando em consideração os serviços de fornecimento de água tratada, investimentos no setor e o modo como é tratado o esgoto gerado por essas cidades cuja população corresponde a 40% do total da população brasileira. Segundo o levantamento, 34 cidades coletam mais de 80% de seu esgoto, enquanto apenas cinco coletam 100% – Belo Horizonte (MG), Santos (SP), Jundiaí (SP), Piracicaba (SP) e Franca (SP). Embora, em grande parte, as maiores cidades do País tenham avançado em relação aos serviços de saneamento básico, um número significativo de municípios não demonstrou incremento dos investimentos: 32 cidades ainda encontram-se na faixa entre zero e 40% de seu esgoto coletado.
“O levantamento do Trata Brasil e os números gerais do SNIS 2010 evidenciam que o Brasil tem um enorme desafio pela frente até alcançar a universalização do saneamento básico, sobretudo no acesso à água tratada, à coleta e ao tratamento dos esgotos. Apesar dos inegáveis avanços, o que deveria ser um direito humano ainda é negligenciado por muitas autoridades, inclusive nas grandes cidades”, declarou o presidente do Instituto Trata Brasil, Édison Carlos.
O problema do acesso à água potável, além da escassez, tem como componente a desigualdade com que os serviços de água e de saneamento são oferecidos. “Pode-se dizer que ambos os fatores contribuem para o problema. Além de ser um recurso limitado, sua distribuição também é desigual. Daí que enquanto alguns não têm acesso à água, outros a desperdiçam. Em médio prazo, isso pode trazer risco de escassez a todos”, afirmou Mattar, do Akatu.
Bernardo Vianna / VIA blog