* Publicado originalmente em VIA blog – Direitos da Criança e do Adolescentes em 31 de outubro de 2014. Foto: Instituto Fazendo História.
Para Tatiana Barile, coordenadora de projetos do Instituto Fazendo História, a realidade dos serviços de acolhimento, por vezes, ainda é um tanto distante dos parâmetros e diretrizes nacionais para a garantia da qualidade desses serviços. “Muitas vezes as atuações dos profissionais está ainda pautada em ideais referentes a um modelo antigo de acolhimento – antigos orfanatos, de longa permanência, com caráter assistencialista e de caridade”, avalia.
Para a especialista, uma equipe que entenda seu papel e esteja preparada para as dificuldades do dia-a-dia em uma instituição de acolhimento é necessária para assegurar a qualidade de vida das crianças e dos adolescentes em situação de vulnerabilidade. E uma importante ferramenta de aprendizado de novos conteúdos e, sobretudo, de troca de experiências e descobertas tem sido a formação continuada.
A promulgação do Plano Nacional de Promoção, Defesa e Direito à Convivência Familiar e Comunitária, em 2006, e da Lei 12.010/2009, a chamada Lei Nacional de Adoção, ampliou a demanda por profissionalização dos serviços de acolhimento institucional e por profissionais que compreendam a nova posição do serviço na rede de garantia de direitos da criança e do adolescente. “A partir das trocas e conteúdos abordados no encontro [de formação], a ideia é que a equipe possa construir um projeto de ação pautado nos parâmetros atuais, elaborando estratégias para o trabalho a partir das individualidades de cada criança e adolescente e atuando de forma alinhada”.
Um dos programas desenvolvidos pelo Instituto Fazendo História caminha justamente essa direção. Atuando em parceria com os serviços de acolhimento, o Programa de Formação de Educadores realiza encontros temáticos de formação, supervisão institucional e oficinas abertas à rede de serviços. “São realizados encontros mensais, sendo que em cada encontro é abordado um tema diferente, com vagas para 20 diferentes serviços, possibilitando a troca entre atores da mesma rede”, explica Barile.
A metodologia dos encontros é participativa e utiliza recursos diversos, como textos, vídeos e vivências. Educadores e técnicos são convidados a refletir sobre o histórico do acolhimento, sobre parâmetros atuais e sobre a prática que desenvolvem, apropriando-se de seu papel no contexto do acolhimento e assumindo uma postura crítica e articulada com a rede de serviços.
“O formato e os temas do processo são definidos sempre em parceria com cada instituição, a partir de diagnóstico inicial, podendo-se desdobrar em encontros temáticos, supervisão institucional, discussão de casos, construção de projeto político pedagógico e oficinas. Os temas abordados são referentes ao cotidiano do trabalho, tais como parâmetros legais, histórias de vida, papel do educador, sexualidade, agressividade, regras e rotinas, autonomia, adolescência, bebês, entre outros”, conta Barile.
Atendimento psicoterapêutico
Outra ação desenvolvida pelo Instituto Fazendo História e voltada aos educadores dos serviços de acolhimento institucional envolve o atendimento psicoterapêutico desses profissionais. Conforme explica Barile, as crianças e os adolescentes encaminhados aos serviços de acolhimento sofreram rupturas importantes em suas vidas, sendo que os principais motivos de acolhimento são o abandono, a negligência e a violência. É importante, portanto, que a equipe esteja preparada para acolher essa criança ou adolescente, oferecendo recursos para que ela possa elaborar e reparar o trauma vivido.
“Os educadores nos serviços normalmente tem que enfrentar uma grande carga emocional ao lidar com histórias de 20 crianças e adolescentes diferentes, com seus conflitos e com as expressões de seus sentimentos, que muitas vezes se dão por meio de comportamentos agressivos. Todas essas histórias mobilizam sentimentos nos educadores, que por vezes viveram situações parecidas àquelas que escutam das crianças”, explica Barile.
Por esse motivo, para poder acolher e auxiliar as crianças e os adolescentes durante esse processo é preciso, de acordo com a especialista, que os educadores possam ter espaços para cuidar de si, elaborar suas histórias traumáticas e falar das angústias vividas no cotidiano, podendo, assim, estar mais disponíveis para a relação com a criança. “Por este motivo, o suporte psicoterapêutico aos educadores é um diferencial que pode contribuir muito para o atendimento”, afirma.
Bernardo Vianna / VIA Blog